Então é Natal, outra vez! Junto com a data, vem também aquela longa lista de presentes que geralmente compramos para amigos, familiares e colegas de trabalho. Nos Estados Unidos, conforme explicado nesse texto sobre o Thanksgiving, a temporada de compras natalinas é oficialmente aberta no Black Friday, e os descontos e promoções a partir da data são tantos que, por menos consumista que a pessoa seja, se torna quase impossível resistir à tentação de aproveitar a época para fazer as compras do Natal. Marcas norte-americanas como a Forever 21, Aeropostale e American Eagle, além das europeias, também muito populares por aqui, H&M, Zara, Mango, Topshop, dentre muitas outras, estão entre as que mais vendem nessa época do ano devido aos seus preços extremamente atrativos! E é aqui, senhoras e senhores, que começa um problema que poucas pessoas se dão conta de que existe e de como contribuímos diariamente para o seu aumento: as consequências da política do “Fast-Fashion” norte-americano!
Fast-o quê?
Fast-Fashion, igual ao termo Fast-Food! O Fast-Fashion nada mais é que uma filosofia de fabricação de roupas e consumo que surgiu nos EUA na década de 1980. A ênfase está na otimização de certos aspectos da cadeia de abastecimento para estas tendências, isto é, roupas que são concebidas e fabricadas de forma rápida e barata, permitindo que o consumidor convencional possa estar sempre comprando roupas atuais a um preço baixo. Estudos mostram que, em meados da década de 1980, quando este o Fast-Fashion começou, os norte-americanos compravam 5 vezes menos a quantidade de roupas que consumem atualmente. E isso foi na época em que o famoso American Dream estava a todo o vapor e o poder aquisitivo do norte-americano era mais alto do que é atualmente! Hoje, os norte-americanos importam, de países como a China, mais de 1 bilhão de peças que são vendidas em lojas que seguem a política do Fast-Fashion. Atualmente, uma peça de roupa nos EUA, tem, em média, uma “vida útil” de apenas 35 dias. Sim, 35 dias!
Para responder a uma demanda tão agressiva, a indústria têxtil teve que se adaptar. Deixamos de usar peças de linho, couro e denim (jeans) puro, e passamos a vestir peças de algodão mais barato regado a muito agrotóxico, fibra de poliéster ou de nylon. Para isso, precisamos destinar cerca de 70 milhões de barris de petróleo anualmente para produção de fibra de poliéster que, atualmente, é o material que mais compõe nossas roupas. Com essa quantidade de petróleo, a indústria chega a produzir aproximadamente 150 bilhões de peças por ano. O problema é que cada peça de fibra de poliéster produzida leva até 200 anos para se decompor. Uma família norte-americana joga fora, em média, mais de 30Kg de roupas por ano. Se multiplicarmos esse valor pelo número de famílias que residem nos EUA, chegaremos a um total de mais de 10 milhões de toneladas de roupas descartadas anualmente. O que fazer com tanta roupa descartada? Pagamos pouco pelas peças de roupa em si, mas pagamos caro pelas consequências que acompanham o nosso alto consumo a “precinho de banana”.
Aumentamos o consumo do petróleo, de gases emitidos para transformar esse petróleo em poliéster, aumentamos a quantidade de agrotóxico utilizado nas plantações de algodão, poluímos rios jogando todo tipo de resíduo da indústria têxtil, destruímos pouco a pouco a indústria apicultora, que não consegue mais polinizar plantações devido às toxinas das sementes, e por aí vai. A alta velocidade desse consumo exacerbado não contribui negativamente apenas contra o meio ambiente, mas também para a exploração de serviços. Algumas empresas chegam a pagar menos de US$ 1,00 por dia para trabalhadores em países como Bangladesh, China, Vietnã, Camboja, dentre outros. São milhões de pessoas que trabalham em um regime de semi-escravidão, dia após dia, costurando as nossas blusas, calças, vestidos e shorts para que possamos comprá-las e descartá-las dentro dos próximos 35 dias… Queremos sempre mais. Mais produtos, de forma mais rápida e mais barata. E depois? Bem, depois pensamos nisso, certo?
E esse problema tem solução?
Ainda tem. Com a pressão de grupos ativistas que se dedicam a questões ambientais e/ou de direitos humanos, algumas marcas vêm criando campanhas de reciclagem de roupas e as chamadas coleções sustentáveis. Locais como a rede Goodwill, nos EUA, além dos brechós independentes, estão sempre aceitando doações. Quanto às coleções sustentáveis, as empresas vêm estimulando a criação de peças geralmente fabricadas com materiais orgânicos e “fair-trade”, ou seja, livre de exploração.
Nos EUA também vêm ganhando cena as campanhas virtuais que incentivam a troca de roupa entre blogueiras e fashionistas, ao invés da compra de peças novas e descarte de peças antigas. Uma pessoa separa peças de roupas que ainda estejam em bom estado, mas por algum motivo já não a queira mais, e envia para alguém que tenha interesse. A pessoa que receber essas peças irá fazer o mesmo. Desta forma, há mais troca e menos desperdício. Um desses programas se chama Hauternative, uma mistura das palavras haute (palavra francesa usada aqui para se referir à alta costura ou moda em geral) e alternative (alternativa, em inglês), ou seja, uma alternativa para as suas roupas. O Hauternative foi criado pelo movimento “Fashion Revolution”, um dos grupos que vem incentivando esse desaceleramento de produção e consumo da indústria têxtil. Este ano, houve, inclusive, a primeira Fashion Revolution Week da história. Nenhuma peça de roupa utilizada no desfile era de nova. E foi um verdadeiro sucesso!
Existem também empresas e start-ups, como a ThredUp, que funcionam como lojas virtuais de peças de segunda mão, ou até mesmo a Rent The Runway (já citada neste artigo aqui), onde, ao invés de comprar uma peça, o cliente pode alugar por um período de tempo e devolver. É só fazer o cadastro no site ou no aplicativo dessas empresas.
As alternativas existem, basta se conscientizar de que o problema existe, ter boa vontade e procurar a solução que melhor se aplica a você. O importante é contribuirmos de forma positiva de alguma maneira.
Deixo aqui um vídeo sobre o assunto para aqueles, que assim como eu, eram cúmplices da política Fast-Fashion, mas aprenderam sobre as consequências perigosas dessa filosofia e decidiram contribuir de forma positiva para o meio ambiente. Quem quiser saber mais, por favor, assista ao vídeo de Elizabeth Cline, autora do livro “Where Does Discarded Clothing Go?” (Para onde vão as roupas descartadas?)