A República Tcheca é um país de leitores.
Ônibus, metrô, tram… parece que por aqui esses sim são os lugares perfeitos para encontrar livros ou readers. Confortavelmente sentados ou se equilibrando em pé, eis aí a comunidade de tchecos leitores. Uma classe que não faz distinções; seja a adolescente punk, o executivo atrasado ou a senhora idosa com sacolas de compras, um livro ou um reader podem muito bem estar nas mãos de qualquer um deles.
Sim, o tcheco lê. E isso não sou eu que digo. Nos últimos anos o Instituto de Literatura da Academia de Ciências realizou algumas pesquisas para entender mais sobre os leitores de seu país. O resultado apontou o tcheco como o povo que mais lê na Europa – são em torno de 17 livros por ano e o número aumenta entre os idosos. Um dado interessante da pesquisa diz que em media 38 minutos diários são dedicados a tal atividade – o que se encaixa bem no que percebo, dado que em muitos dos casos esse é o tempo gasto na viagem casa x trabalho x casa. Isso entre os leitores, é claro.
Mas como os tchecos se tornaram devoradores de livros?! Há quem declare que o gosto pela leitura é um efeito colateral remanescente do regime comunista. Com o clima de repressão que reinava, mergulhar na leitura de um bom livro era como fugir um pouco da realidade. Por outro lado, a mesma repressão e acesso limitado ao que vinha de fora fazia da leitura um caminho para um conhecimento não acessível.
Parece que temos aí os ingredientes necessários para fazer valer o dito ‘proibido é mais gostoso’. Seja por um motivo ou por outro, o gosto pela leitura e o orgulho da biblioteca pessoal se enraizaram e perpetuaram nas gerações que se seguiram.
Assumindo que tchecos leem tchecos, do nosso conhecimento limitado da literatura desse povo talvez dois nomes nos venham a memória: Franz Kafka e Milan Kundera. O primeiro, apesar de boa parte de suas obras ter sido escrita em alemão, faz notar seu prestígio pelas ruas da capital tcheca em monumentos, cafés, museus entre outras referências ao nome do autor.
De Kafka destacam-se principalmente Metamorfose e O processo. Já Kundera (e sua Insustentável leveza do ser) está longe de ser aclamado por seus conterrâneos. Alias, temo que muitos tchecos não aprovariam o uso da palavra ‘conterrâneo’ na frase anterior. Fato é que num período em que artistas e escritores perderam seus empregos (ou a liberdade de exercê-los), emigrar foi a solução escolhida por muitos. Kundera foi apenas mais um nesse grupo. O problema em si foi que, vivendo na Franca, chegou a desfazer publicamente de suas raízes tchecas – o que continua a alimentar essa inimizade-literária até os dias de hoje.
Nem Kundera, nem Kafka; o livro mais traduzido da literatura tcheca é obra de Jaroslav Hašek: The good soldier (publicado no Brasil sob o título As aventuras do bom soldado Švejk). O protagonista, Švejk, desafortunado e simples é muitas vezes tido como a personificação do tcheco.
Na era dos e-books é difícil estimar quem/quando/o que leem, contudo pode-se dizer que o tcheco mais vendido do momento é Michal Viewegh. Aos que estiverem se perguntando se há brasileiros nas estantes das livrarias por aqui, eis aí a resposta:
Convém ainda mencionar que, mesmo na era digital, as bibliotecas não saíram de moda – o levantamento da Biblioteca Nacional registrou mais de 300 mil empréstimos no ano 2013.
É novembro, quando o espírito natalino (ou seria o consumismo?) já tomou posse da cidade e onde quer que se olhe há sugestões de presentes para compor a cena com o pinheiro decorado… lá estão os livros. Nem é preciso entender muito de publicidade para saber que não poderia haver lugar melhor para divulgar livros do que as paredes do metrô.
Com ou sem propaganda, considero que livros são sempre bem-vindos.
1 Comment
Oi Giselle,
Adorei seu texto.
Olha, sou uma pessoa que lê muito, mas nada comparado ao tcheco. Caramba! 17 livros ao ano e esse número ainda pode ser maior? É livro que não acaba mais…rs…
Acho que preciso me espelhar mais nos tchecos e ler mais, quem sabe a metade pelo menos 🙂
Beijos