A importância da diversidade é a principal lição que aprendemos quando imigramos.
Em conversas com pessoas muito mais experientes que eu, na arte de morar fora do Brasil, um tema sempre vêm à tona: o lugar onde se vive mais fortemente um sentimento de solidão, é nos EUA.
Apesar dos sorrisos simpáticos, da gentilezas exageradas e das exclamações efusivas, o americano é fruto de uma cultura extremamente reservada, que funciona de forma oposta à nossa brasilidade.
Em princípio ficamos encantados. As pessoas são infinitamente mais educadas do que no Brasil. Todos falam bom dia, boa tarde, boa noite, seguram a porta do elevador, esperam você atravessar a rua, dão passagem quando você aciona a seta do carro, perguntam sempre como você vai, até no caixa do supermercado e da farmácia, mas….
Não ouse responder! Não confunda educação com amizade. Não espere que te ouçam quando você começar a falar da sua vida, ou dos seus interesses. Isso criará um momento constrangedor, de olhares e sorrisos amarelos, e provavelmente, seu interlocutor, apavorado, jamais irá te perguntar novamente sobre a sua vida.
Já vivo aqui há 5 anos. Primeiramente na região de Washington DC e atualmente em Seattle. Além disso, viajei um bocado, por muitos estados e tenho família e amigos vivendo em Nova York, Flórida, Filadélfia, Ioha e Hawaii. Não possuo dados estatísticos ou científicos, mas a minha experiência é que, americanos em geral, são avessos a qualquer tipo de intimidade.
Minha colega de BPM, Analu Tavela, escreveu um ótimo texto sobre o assunto, que você pode ler abaixo. Eu não sei se concordo com o termo que ela adota “superficialidade”, porque para nós, brasileiros, remete a um conceito muito pejorativo. Mas é inegável, que falta profundidade nas relações com americanos, e não há outro termo melhor que defina isso. Agradeço, quem tiver sugestões.
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Precisamos então nos adaptarmos. Além das óbvias mudanças climáticas e culturais, que afetam diretamente nossa estrutura tropical, é preciso se adaptar às mudanças sociais. A solidão é uma constante por esses lados.
Depois de um tempo dolorido de aprendizado, acho que consigo diferenciar os sentimentos de solidão e solitude. Solidão é um sentimento triste, que nos faz sentir uma sensação de abandono e isolamento de tudo e todos. Solitude é apreciar esse momento e sentir-se confortável na sua própria companhia. É aprender a valorizar os silêncios e ausência de companhia, em que nós conseguimos nos comunicar profundamente conosco mesmo.
Eu confesso, que passei a gostar e aceitar esses instantes só meus, onde sou respeitada em minha intimidade, e não preciso me expor, ou ser exposta a ninguém.
Recentemente uma outra mãe da escola da minha filha, veio me perguntar educadamente sobre a minha mudança dos EUA. Me senti acolhida e comecei a narrar a ela, os nossos motivos e projetos futuros. A mulher se apavorou de uma tal maneira, que simplesmente saiu andando e me deixou falando sozinha. Uma lição, que eu teimosa, já deveria ter aprendido!
Foram tantas situações assim, que eu já deveria ter me habituado, mas a brasilidade continua latente. Sou brasileira, como escrevo aqui e não deveria me sentir ofendida. A questão não é pessoal, é cultural!
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Essa diferença comportamental e emocional, entre pessoas de diferentes países é um dos temas que mais me fascina. Se eu fosse mais jovem, certamente me envolveria em uma pesquisa acadêmica profunda sobre o que move nossas escolhas e atitudes sociais.
Como atenta observadora da vida cotidiana, sem pretensões científicas, noto que nas crianças, esse comportamento não está impresso. Recebo muitos amigos das minhas filhas em casa, na sua grande maioria, americanos e filhos de americanos. (Seattle é uma cidade majoritariamente caucasiana e ainda pouco diversificada pela imigração).
Quando crianças, todos são extremamente parecidos. Falam sobre a vida, sem medo, sem filtros ou freios. São igualmente calorosos como qualquer povo latino. Até me divirto pensando na cara dos pais, se souberem sobre tudo que as crianças falam! Em que momento, isso muda, e eles passam a se blindar para o que vêm de fora?
O momento político em que vivemos parece intensificar ainda mais esse comportamento, com campanhas massivas em todas as mídias, alertando sobre os “perigos” que os diferentes (imigrantes) podem causar. Cria-se assim, um espaço de pânico e desconfiança, em que tudo que é diferente é visto como ameaça.
Contudo o campo científico parece apontar para um caminho contrário. Tive a honra de conversar com o pesquisador e geneticista Alexander Tarakhovsky da Rockfeller University em Nova Iorque. Esse avançadíssimo centro científico é a casa de nada menos de que 28 Nobel Prizes ao longo da história, portanto são trabalhos absolutamente bem fundamentados. A pesquisa de Tarakhovsky está focada na resistência celular que é criada a partir de invasões virais e bacteriais. Ele amplia a discussão para além do plano científico e chega às artes, concluindo que a exposição ao diferente é que nos faz resistentes.
Leia aqui Entrevista com Alexander Tarakhovsky
Vemos então que não só culturalmente e socialmente, mas também geneticamente! Nossa formação genética se beneficia muito perante à exposição e invasão daquilo que é diferente à nossa constituição celular, criando memórias que ficarão impregnadas em nosso DNA e serão transmitidas aos nossos descendentes.
Abraçar as diferenças. Para mim, o único caminho possível para uma existência mais plena. Concordam?