Quando a possiblidade de viver nas Arábias foi se concretizando para a nossa família, um dos pontos de bastante dúvida para mim, como mulher (e vaidosa que sou), era: “e essa questão da roupa por lá?”.
A University of Michigan’s Institute for Social Research fez uma pesquisa com a seguinte pergunta: “Como as pessoas dos países muçulmanos preferem que as mulheres se vistam em público?”. No gráfico abaixo você confere o resultado.
Eu já dei umas voltinhas por aí visitando países como Turquia, Qatar, Kuwait, Jordânia, Maldivas, Emirados Árabes, dentre outros. Todos de maioria islâmica. Minha presença com roupas “comuns”, e sem o uso do véu cobrindo a cabeça, nunca me causou “olhares indiscretos”. Já na Arábia Saudita, berço do Islã, a história é outra: por se tratar de um país bastante conservador, aqui todas mulheres, incluindo as expatriadas, usam a abaya (aquele vestidão preto que cobre todo o corpo), em locais públicos.
Assim que cheguei era estranho não poder usar a roupa que sentia vontade, mas com o tempo acabei me acostumando com o meu pretinho básico. Hoje até vejo vários lados positivos. Quer ver?
• Guardo meus modelitos para as viagens ou eventos nos condomínios fechados nas casas de amigos;
• O gasto com roupas diminuiu bastante, em geral consigo economizar muito mais;
• Quando vamos ao supermercado, médico, ou fazer algo na rua não preciso de horas para me arrumar escolhendo roupas: é só pegar a bolsa e jogar a abaya por cima que tá tudo certo.
Brincadeiras à parte, a verdade é que, em alguns lugares por aqui, até me sinto mais segura vestindo a abaya. Sinceramente ainda não sei se eles estão preparados para ver as mulheres passeando por aí de camiseta e calça jeans. Em alguns lugares mesmo vestindo abaya eu recebo olhares constrangedores…difícil de acreditar, mas acontece.
Eu não me importo em usar a abaya aqui, e prefiro de certa forma ficar “segura” do que “gatinha”. Mas a abaya não é somente aquele vestidão preto (aka “sem graça”). As mulheres sempre dão o seu toque individual em cada roupa: tem abaya com animal print, cheia de bordados coloridos, rendas, desenhos personalizados e até com aplicações de cristal swarovski (que fazem a abaya valer uma pequena fortuna). Até de abaya as mulheres dão um jeitinho de mostrar o seu lado fashion.
Uma curiosidade da região, são as bonecas no estilo Barbie conhecidas por aqui como “Fulla”. Assim como a nossa “Barbie” a “Fulla”, pode ser encontrada nas lojas de brinquedos em vários modelitos locais (vestindo abayas mais conservadoras, ou mais moderninhas). Elas fazem a alegria das meninas por aqui, afinal para essas crianças a abaya e o uso do véu são naturais do dia a dia: os pequenos sempre viram a mãe e todas as mulheres da família vestidas assim (pelo menos em lugares públicos).
Esse assunto sem dúvidas, gera muita discussão e polêmica globalmente. O resultado do estudo da University of Michigan’s Institute for Social Research nos mostra a diferença entre esses países que participaram da pesquisa: o que é aceito para a mulher se vestir é diretamente proporcional a quanto um país é conservador ou mais liberal.
Todas essas restrições soam surreais para muita de nós brasileiras: na terra Tupiniquim, onde os índios, os primeiros Brasileiros, estão sempre “au naturel”nus ou semi nus. Sua cultura é assim, sua tradição é essa, e tudo certo com isso.
No nosso país, temos a liberdade de nos vestirmos como bem entendermos: vale shortinho da moda da novela do horário nobre (bem curtinho-inho-inho…), top (quase um sutiã)… ou simplesmente uma roupa mais modesta e comportada. Vista-se como quiser no Brasil e não será julgada por isso.
De acordo com dados da 7ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, nunca existiram tantos estupros no Brasil. A verdade é que muito desses números se dão ao fato de que hoje as mulheres denunciam mais. Afinal hoje as brasileiras podem contar com leis e locais de apoio contra a violência à mulher, que antes não existiam – informação é tudo.
Talvez seja interessante fazer uma correlação do aumento dos estupros ao resultado do Brasil no Índice de Desenvolvimento Humano: o nosso país está na 85ª posição do ranking. Esses dados nos levam a seguinte conclusão: um povo precisa de educação para receber liberdade, e assim saber lidar bem com ela.
Vou encerrando minha narrativa (deixando infinitas possibilidades para reflexões construtivas), com uma sábia frase da minha querida avó: “já que não podemos cancelar o baile, o melhor é dançar conforme a música”. E sigo tranquila com o meu pretinho básico por aqui.
23 Comments
Carla, parabens pelo texto.. meu primeiro contato com o povo mulculmano foi quando vim morar na Asia, e tenho que dizer que foi impactante, e levei um tempo para acostumar com a ideia de ver o povo coberto para entrar piscina ou tomar banho de mar. E aos poucos fui entendendo e conhecendo mais sobre esta cultura, eu mesma tenho alguns trajes que uso quando vou as celebracoes mulculmanas por aqui, mesmo que Cingapura, nao seja tao tradicional com em Saudi….
Nossa Ju, que interessante. Não sabia que mesmo em Cingapura tinha tanta influência da cultura muçulmana por ai. Muito obrigada por compartilhar conosco 🙂
Bom texto Carla parabéns.
Com relação aos números de estupros no Brasil eu não entendi bem qual foi a sua intenção ao coloca-lo aqui.
É que para mim é um assunto muito delicado e temo que seja mal entendido. Afinal, não podemos colocar a culpa do estupro no tamanho da saia de uma mulher concorda?
No Brasil temos uma falsa liberdade. É só para inglês ver!
Enquanto é lindo ver na TV uma mulher rebolando, para namorar ela não presta. Se uma mulher diz não a um homem, ela está só fazendo charminho e se “chegar” em um homem ou usufruir da sua liberdade sexual, ela é intitulada com palavras de baixo calão.
Lí um texto bem interessante semana passada que falava exatamente sobre os palavrões para denegrir uma mulher. Já percebeu que todos tem a ver com a sua liberdade sexual enquanto, com os homens é só questão caráter?
A verdade é que com burka, abaya ou saia curta a mulher ainda está longe de ter a mesma liberdade que o homem.
A única diferença é que no Brasil não se morre com tanta frequência por falar o que pensa, como em outros países (mas ainda se morre). A diferença é que na Alemanha não se é tão julgada quanto no Brasil, mas ainda se ganha menos que um homem.
A tortura emocional, desmoralização da mulher; a humilhação ainda estão muito presente e por incrível que pareça, enquanto estou passando minhas férias aqui no Brasil, o que eu mais noto é um machismo que vem das próprias mulheres. É um julgamento constante e difícil, principalmente para quem já se desacostumou a ser tão julgada.
Show tua reflexão!
Carla, muito bom seu texto.
E dirigir, agora mulher pode? Vi que algumas mulheres estavam desafiando a lei…..ou sera assunto para um proximo texto?
Bj
Oi Monica, muito obrigada 🙂 Pois é, elas estão lutando pelo direto de poder dirigir, afinal esse é o único país do mundo em que elas são proibidas. Eu particularmente acredito que isso ainda vai levar um tempo… mas vai saber? Eu não me atreveria a dirigir por aqui, pelo menos por enquanto: nunca vi motoristas “tão barbeiros” como nessa terra. Prefiro continuar de carona, ou com o marido, no banco da frente, ou com o motorista, sentada no banco de trás (e sempre com cinto de segurança) 🙂
Bem interessante essa visão Carla. Li um livro de uma repórter ocidental (agora me fugiu o nome) em que ela relatava exatamente o que vc citou: chegou uma hora qe ela se rendeu à burca (sim, no lugar onde estava era mais radical ainda) por uma questão de segurança. Agora que me incomoda muito isso, em especial as burcas, também não posso negar. Nos últimos 5 anos tenho feito minhas viagens ao Brasil via Emirados ou Qatar, e no aeroporto que é território livre, o contraste fica tão gritante, me sinto asfixiada só de olhar. Depois da minha primeira viagem por essa rota, cheguei no Brasil revoltadissima, incomformada e meu pai saiu com essa: será que aquelas mulheres não ficam tão incomodadas como vc está agora, ao ver as ocidentais de shorts e barriga de fora? Parei, pensei e depois disso, sempre procuro lembrar desse detalhe quando me deparo com essas mulheres.
Beijo e parabéns pelo texto.
Oi Carla, genial seu texto e aliás bem brasileiro com jeitinho de ver o lado bom das coisas, mesmo que tenha que usar seu pretinho básico em todas as ocasiões!!
Bejoss
Ana Carina, muito obrigada! Você tem razão, nada melhor que o otimismo para ver todas as situações pelo lado positivo 🙂
Gente! Acho que eu quero uma abaya com Swarovski, por favor? Haha!
Brincadeiras à parte, um dia compramos um vôo para a Europa que passava por Jiddah e nosso vôo atrasaria 24h… Comecei a pesquisar sobre os costumes e vi que na Arábia Saudita tínhamos que usar abaya… No final, mudamos o vôo porque ficar 24h no aeroporto não rola (afinal, a Arábia Saudita tampouco emite vistos de turistas).
Achei bem legal seu texto sobre a forma de se vestir porque esse é um tema bastante controverso. Achava, antigamente, que as mulheres eram bastante oprimidas por terem que usar as abayas e as burkas em territórios árabes, mas esse conceito mudou quando vi em um filme uma cena que arrancaram o lenço da cabeça de uma das personagens e, para ela, aquilo foi uma falta de respeito, como se arrancassem um pedaço da sua roupa. Acho que é uma questão de cultura e costume, no final.
Quanto ao Brasil… Carla, eu acho que nós, brasileiros, julgamos. Eu mesma, quando estou no Brasil, em pleno verão, e vejo aquele festival de gordura pulando da calça, o tomara-que-caia naquele peito já caído e todo aquele festival de breguice que só brasileiro consegue fazer, acho uma falta de bom senso…
Bom, gata, parabéns pelo texto!
Beijos!
hahahahahaha… dei muitas risadas com o seu comentário! Adorei, muito obrigada. Concordo com você Tati! Um beijo grande
Carla querida, me lembrei logo de uma cena do filme “sex and the city”onde as mulheres mostravam que embaixo das burcas tinham todas os últimos modelitos de marcas que eram usadas em NYC. kkkkk Bem brincadeiras a parte, eu sou a favor de respeitar e integrar-se ao pais onde vivemos, por isto acho importante a sua integracao local vestindo abaya. E quando a burca, com é, voce também tem que usar? e dentro de casa? como se vestem as mulheres locais? Quanto a questão estrupo não sei se tem haver com se vestir coberta ou não, se pensamos em culturas como na Escandinavia por exemplo e mesmo na Alemanha, as pessoas tomam sol nuas em parcas publicas, avo a sauna mista nus, e tudo isto sem maiores problemas, frequento muito sauna, por exemplo, e posso dizer que nunca tive problemas ou escutei sobre algum problema de abuso sexual devido a esta nudez, tem que se dizer que não ha tambó;em nada de sensualizar nestes momentos, as pessoas são literalmente naturais e sem poses e pensamentos sexuais, voeje ve famialis inteiras de 3 gerações indo a sauna e brincando na piscina naturalmente e sem roupa. O caso de estrupos no Brasil vejo como um problema cultural de respeito a mulher na sociedade. E o mesmo posso compreender em relação aos olhares que mesmo vestindo abaya voce possa receber por estas bandas. Por outro lado, sou contra aos muçulmanos quererem levar estes costumes pra outros países, por exemplo na Alemanha segui varias discussões por causa dos turcos que mandam suas crianças com abayas pra escola publica local e exige que exista lei que os proteja neste sentido, acho horrível, pois sou a favor da liberdade de expressão de cada um, mas acho importante a integração ao pais local e não a imposição de um cultura que deixei no meu pais dentro do pais onde escolhi viver. Sempre acho a forma de pensar dos muçulmanos muito unilateral, quando é a cultura deles, tem que ser respeitada, mesmo que me outros países, mas no pais deles não existe esta tolerância, Muito bom o tema! Gostei muito! Namasté
Oi Carla!!!
Estou amando ler sobre sua experiencia por ai!!! Gostaria que se vc poder escrever mais sobre Damman…por sinal namoro a 1 ano um Arábe de Damman 🙂 hehehehe Apesar de já conhecer muita coisa sobre a cultura deles ainda busco muittaa informação, pois sou apaixonada por novas culturas! Porém, vem aquela imensa dúvida de como eh a vida por ai, como as mulheres realmente são tratadas! Moramos em Calgary- Canadá e nosso namoro já foi apresentado totalmente pelo lado de minha parte, ou seja, pai mãe irmãos e cachorro já conheceram ele! Porém ainda não fui assumida como `namorada` para família dele, Claro, a final de contas NAMORO NÃO existe no Islã…o que leva ao caso de que só irei ser apresentada a família dele quando casarmos, que por um lado totalmente entendo e compreendo! Bem, eu iria amarrrrr aprender mais sobre as mulheres por aí, pq aqui todos os meu amigos são arabes HOMENS 🙁 e continua postando mais coisas e fotos Carla!!!! Bjãoooo Obrigada
Oi Ida,
Pelo visto você já está bem ambientada com a cultura árabe – talvez até mais do que eu 🙂 Mensalmente eu escrevo por aqui sobre as curiosidades do Oriente Médio/Arábia Saudita. Fique de olho no cariocatravelando.com – está saindo uma série quentinha dedicada à Arabia Saudita. Espero que você goste. Um abraço, Carla 🙂
Ah, meu numero eh o +14038052479 se quiser me add no whatsapp e podemos trocar bastante fotos! hauhauhauhaua
Pingback: Arábia Saudita – Casar Sem Amor
Olá Carla, como vai? Navegando pela net, tive o prazer de encontrar você e o seu blog. Gostei muito de tudo que você escreveu, ótimas dicas, um verdadeiro achado. Li o seu post sobre as ilhas Maldívias e fiquei encantada com tudo que li e vi. Sempre tive vontade de conhecer essas ilhas. Gostaria de saber de você se é muito difícil sobreviver lá sem falar inglês, pois não falo nenhum idioma, tenho muito medo de ir para lá e de repente, sei lá, não conseguir curti com a minha família, pois o meu marido também não fala outro idioma. Você pode nos orientar? nos dar mais dicas sobre essas ilhas? e sobre o hotel que você ficou? Aguardo seu contato. Obrigada.
Oi Maria Claudete, fico feliz que tenha gostado do Carioca Travelando 🙂 As Maldivas são realmente um paraíso… impossível não se encantar com tanta beleza. Com relação ao idioma, se vocês forem com o básico do inglês, e com tudo bem planejado antes de sair de casa (hotéis, voos, tudo arranjado direitinho), creio que aproveitarão bastante a viagem sem problemas. Mas é bom pelo menos, ter uma noção básica do inglês. Tem 3 posts lá no cariocatravelando.com explicando tudo sobre a viagem, inclusive sobre o hotel que ficamos – Dá uma olhada lá. Um abraço e aproveitem muito as férias em família 🙂
Olá Carla… Meu nome é Clara e tb vivo na Arábia Saudita… Onde vive você? Eu sou portuguesa e estou aqui à 7 meses. Me diga algo.
Olá Clara,
Portugal está no meu coração, e é a minha segunda pátria – também sou cidadã Portuguesa. Vivemos em Dhahran, próximo à fronteira com Bahrain. E você, onde vive? Dá uma olhada no meu site o CariocaTravelando.com Lá tem muitas dicas e informações sobre a Arábia Saudita. Seja muito bem vinda! Um grande abraço
Oi Carla!
Achei bem interessante seus comentários sobre a Arábia Saudita!
Gostaria de saber algo a mais, pois estarei indo para Jubail em julho de 2016 e estou um pouco sem saber o que fazer com relação às roupas, pois sei que até as expatriadas tem que se vestir em função do costume local.
Além do vestido preto e necessário também usar o lenço?
Voce mora perto do jubail?
Abraço
Sueli
Oi Sueli! Você está indo à Arábia Saudita à trabalho, para viver ou visitar? Dentro dos condomínios fechados não é preciso usar a abaya, mas para sair na rua (shoppings, supermercados e hospitais), é necessário usar a vestimenta. O uso do lenço não é obrigatório, mas aconselho você levar sempre na bolsa “just in case”. Dá uma olhada no http://cariocatravelando.com/arabia-saudita tem muitos posts sobre Saudi por lá. Tenho muitas amigas que vivem em Jubail, me escreva para me contar os detalhes da sua ida: cariocatravelando@gmail.com Um grande abraço e obrigada
Oi Carla, Parabens pelo seu comentario…
Morei no IRA um tempo que e um pouco parecido com a Arabia Saudita.., porem as mulheres tem mas liberdade, como dirigir, trabalhar, fazer faculdade e muitas outras coisas…
Elas nao sao obrigadas a usar Burca preta e podem mostrar o rosto, e abusar das cores… Eu tambem me acostumei com os costumes bem rapido☺️
Fique com Deus.