Faculdade depois dos 40 no Canadá.
Então, aos 42 anos, eu tomei a decisão de morar fora e voltar a estudar. Não foi uma decisão fácil (nem a viagem e nem o estudo). Milhares de dúvidas passaram pela minha cabeça, mas o que mais me martelava era: será que eu teria paciência para mais três anos de faculdade na minha idade?
Aos poucos o universo acadêmico foi reentrando na minha vida. Primeiro na fase de pesquisas, tendo que decidir qual o melhor curso e ler todos os conteúdos das matérias a fim de saber qual se encaixaria melhor no que eu estava em busca: ter maior conhecimento na área de design gráfico.
Passado esse período de pesquisas e escolhida a instituição de ensino, foi a vez de receber informações mais detalhadas sobre cada matéria e professores, grade de horários, mapa do prédio de design, acesso ao e-mail estudantil e ao blackboard (plataforma utilizada por todos os alunos para enviar trabalhos, receber notas, comentários, avisos, etc.)
O fato é que muito mudou desde que eu comecei a minha primeira faculdade, em 1993. A tecnologia de hoje é incrível e é tanta novidade, tanto em relação às matérias estudadas, quanto à estrutura da instituição de ensino, que me senti novamente como se fosse a minha primeira vez.
Leia também: Quais são os prós e os contras de se estudar fora
Preciso levar em conta que na minha primeira graduação eu tinha só 17 anos. Era uma menina, cheia de sonhos, mas também cheia de dúvidas, inquietudes e com um quê de irresponsabilidade que todo adolescente tem. Hoje, aos 42 anos, sou uma mulher madura, casada, com filhos e uma bagagem imensa que me faz olhar para essa oportunidade de aprender novamente com olhos de águia.
Meu principal receio – sentir-me um peixe fora d’água no meio dos Millennials (a tão falada geração Y) – foi embora logo na primeira aula. Óbvio que eu sou a “tia” da turma, a mais velha em meio a uma galera que deve ter, na sua grande maioria, não mais do que 25 anos. Mas a máxima de que no Canadá a questão da idade não importa muito, vale de fato e, embora olhe ao redor e constantemente pense “podia ser mãe daquela menina”, vejo que tenho muito a aprender com eles.
Essa é uma geração que nasceu plugada, ligada, antenada, etc. Tudo o que eu aprendi em anos e anos, eles nasceram sabendo, está entranhado na pele. São mais ágeis, “safos” e muitos, com tão pouca idade, têm muito mais experiência na área do que eu. Porém, isso tudo tem me dado uma vontade ainda maior em aprender. Quero vê-los como parceiros e por mais que muitas vezes me sinta na lanterninha, aprendendo coisas que eles parecem fazer com os pés nas costas, sinto que temos muito a trocar uns com os outros.
Minha turma é bem grandinha, acho que tem umas 25, 30 pessoas de diversas nacionalidades, algo natural em se tratando de Toronto. E é uma galera bem bacana, divertida, animada e apesar da questão da idade, no meio deles eu me sinto só mais uma aluna e esqueço um pouco do peso das diferenças. Nessas aulas tem também duas brasileiras muito queridas e que já viraram amigas, com direito a “grupo-trio” no WhatsApp e tudo. Tê-las por perto é ótimo pois, por melhor que o nosso inglês seja, sempre pinta uma ou outra dúvida que nos sentimos mais confortáveis em tirar entre nós, em português.
O prédio onde tenho aula é bem bacana, com salas amplas e equipadas com computadores modernos. Neste semestre tenho aula de design, produção, tipografia, inglês, digital applications e desenho. Ah, desenho…. Essa tem sido minha pedra no sapato! Sofro, pois sou péssima, não levo jeito, mas não dá para fugir! Já as paredes são cheias de trabalhos dos alunos (do tipo profissionais mesmo) e ainda tem um corredor no estilo de filme gringo, com os lockers (armários) que a gente aluga para guardar o material. Senti-me quase uma adolescente quando peguei o meu…
No dia a dia, a rotina é meio punk, afinal além das aulas e trabalhos de casa (que são muitos e diários!), tenho marido, dois filhos e uma casa para organizar. Esse é um peso extra que eu carrego e que precisei, desde o início, aprender a me ajustar para não me enrolar.
Procuro não deixar nenhum trabalho para a última hora, pois sempre pode ter algum imprevisto em casa, uma criança com febre, um mercado para fazer pois não tem nada na dispensa… Nessas horas é impossível não pensar em como é mais fácil simplesmente ter um colega de quarto para dividir as contas, ovo e cerveja na geladeira e não ter que se preocupar com o jantar das crianças ou a quantidade de roupa por lavar.
Ajustar os horários para ter sempre alguém em casa com as crianças é outro desafio. Sou considerada “full-time student” e muitas vezes, na hora que eles chegam, eu ainda estou em aula. Por enquanto as divisões dessas tarefas com o marido têm dado certo, mas sei que chegará a hora em que vamos ter que colocar alguém para nos ajudar com eles, em alguns momentos. É o preço de estar longe de tudo e de todos.
Aliás, há algumas semanas passei por uma situação inusitada. Eu tinha uma aula e não podia faltar (elas têm duração de 3 horas, se faltar perco muita coisa!) e meu marido tinha um compromisso também inadiável. Os meninos nesse dia não tinham aula e tive que levá-los para o college comigo às 8 da manhã! Dei um celular na mão de cada um, fones de ouvido, lanchinho e deixei ambos no banco do lado de fora da minha sala, avisando a professora que eventualmente teria que checar se estavam bem. Ela foi super compreensiva e no fim das contas, tudo deu certo. Além de tudo eles viraram atração e foram paparicados pelos meus colegas.
Enfim, voltar a estudar, na minha idade e em outro país, é aquela coisa de “se vira nos 30” que toda mãe aprende a fazer. Ninguém disse que ia ser fácil, mas confesso que está bem divertido, estou adorando a oportunidade e tenho certeza de que vou me formar com muito mais empenho do que há 20 e poucos anos!
31 Comments
Oi Flavia! Me identifiquei bastante contigo e acho que pessoas como nós tem aquele comichãozinho que não passa com a idade.
Parabéns e sucesso 🙂
Viva o comichão, Henrieth! Faz um bem danado! Bjs!
Oi Flávia adorei seu texto! Fecha com minha dúvida de recomeçar de novo também! Tenho dois filhos em fase escolar ! Agradeço seu depoimento, com filhos precisamos nos encorajar com outras mães experientes!
Ana Paula, aqui nós pensamos: o máximo que pode acontecer é não dar certo e voltar. Vai em frente! Boa sorte!
Olá Flávia! Seu relato é bem parecido com o que estou vivendo, aos 43, numa universidade australiana. Não tem sido fácil, é matar um leão por dia, mas ao fim de cada semestre, sou a própria protagonista da música “We are the Champions”! Força aí, força aqui e vamos que vamos!
Hahahahaha! Bem isso, Jackeline! Estou prestes a acabar o primeiro semestre de aulas e doida pra cantar pelas ruas 🙂
Obrigada pela sua mensagem!
Parabéns Flávia, pelo depoimento e pela força de vontade! Estou me preparando para isso e, no meu caso, será uma entrada no College com 48 anos! Será que vou aguentar? rsrsrs
Vamos em frente! Abçs.
Aguenta sim, Vinícius! Boa sorte!! 🙂
Oi Flávia, me identifiquei bastante com seu texto! Também sai do Brasil e estou estudando em uma faculdade não China. Não é nada fácil depois que termina às aulas e à noite voltar pra casa e assumir o terceiro turno…E aquele monte de trabalhos pra casa que mais parece q vc vai estudar 2 meses e não consegue terminar na próxima semana! Kkkk. Mas você é uma vencedora, eu não tenho filhos e sinto um pouco do que você sente…”se vira nos 30” seria um nome perfeito para o corre corre diário! Fique com Deus!
Uau! Estudar na China deve ser uma bela aventura! Parabéns pela coragem e obrigada pela mensagem! Bjs.
Olá!
Meus parabéns pela coragem! Estou me preparando para isso também. Tenho 42 anos, duas filhas (9 e 13). Meu marido e eu já estamos iniciando os preparativos (estudo do inglês, as economias e muita, muita pesquisa). Ainda não definimos a cidade mas pensamos em dois ou três anos a viagem. Já me inscrevi para acompanhar o blog, quem sabe nossos caminhos ainda se cruzem, seria muito bom, já virei fã!! Desejo muita, mas muita felicidade nessa nova vida!!
Luana, obrigada pelo comentário! Torço pra que os planos de vocês sigam com sucesso! Vá em frente! Bjs!
Oi Flávia,
Adorei o seu post, temos a mesma idade e estudo na GBC, só que faço Hospitality Hotel Management. Confesso que estava muito anciosa no meu primeiro dia de aula, dar conta da Faculdade, filhos, marido, casa, ufa!!
Por enquanto vai indo tudo bem, alguns imprevistos no caminho, mas nada que não se possa contornar. Só não gosto muito dos trabalhos em grupo (no meu curso não há Brasileiros), uma vezes me convidam para participar da equipe e outras me convido. E assim, em setembro já começarei o terceiro semestre, passa rápido…
Abraços para vc e sucesso!!
Oi, Manuela! Que legal! Qual campus? No meu prédio tem umas aulas de hospitality, será o mesmo?
Eu tb não curto muito trabalhos em grupo, mas felizmente me design tem poucos.
Esse lance de dar conta de tudo é complicado mesmo, mas a gente vai dando um jeito, né?
Bjs!!
Flávia, eu tenho aulas no SJA, SJB, SJE ,SJD, enfim é uma loucura ! Beijos
Nosso prédio, oficialmente é o mesmo seu. Mas, na prática, já passei pelo SJA, SJB, SJD e SJE. Uma loucura, até se acostumar aonde fica cada sala de aula.
Vamos marcar de tomar um café então, Manuela! Estou lá toda segunda, terça e quinta. Me manda msg pelo facebook q eu te mando meu whatsapp, ok?
Adorei seu depoimento. Eu ainda não tenho 40. Tenho 35. Mas quando formos de fato vou estar bem.perto e confesso.que essa é uma situação que me preocupa bastante. Vou com 3 crianças, mas sem dúvidas que estarei fazendo o melhor para minha família.
Se organiza direitinho e vá cheia de disposição, Tatiane! Vai dar certo! Bjs.
Oi Flavia, parabens !!!! muito legal compartilhar conosco sua experiencia.
Vc mora em qual bairro com as crianças ai? poderia nos dar dicas de bairro por favor?
Obrigada vc pela mensagem, Juliana.
Não tem muito essa de bairro ruim ou bom em Toronto. Todo lugar é relativamente seguro e tem boa infraestrutura. Nós moramos na junção da Sheppard com a Yonge, pertinho do metrô e a uns 35 minutos de downtown. É uma área chamada de Willowdale, que fica em NOrth York (antigo município que há alguns anos foi incorporado à cidade de Toronto). Gosto muito daqui! O interessante pra quem chega sem conhecer é tentar ficar relativamente perto do metrô (no inverno, perto significa não mais do que 10 mins andando), pra poder se locomover com mais facilidade. Lembro que a única região que já me avisaram pra evitar um pouco é a junção da Jane com a Finch, mas nem sei se é tão ruim assim. Espero ter ajudado. Bjs.
Puxa, Flávia, muito inspirador seu depoimento! Acho que muito de você aproveitar tanto esta experiência entre pessoas tão jovens vem da sua humildade! Um grande abraço!
Obrigada pela mensagem, Vivian. Acho que o conceito de “largar tudo” pra se aventurar em algo assim engloba, principalmente, a gente estar de coração aberto pra tudo e todos. 🙂
Bjs!
Oi Flávia! Cheguei aqui através da Yara, e adorei te ler! Logo estarei aí também, obrigada por compartilhar!
Oi, Giu. A Yara comentou sobre mostrar o blog a uma amiga. Que bom que vc gostou. Aqui são as minhas participações no BPM, mas tb tenho meu blog pessoal, com outras dicas de Toronto – http://learntoflycanada.blogspot.com/
Qualquer dúvida, só falar. bjs!
Flávia ler seu texto acabou com todas as minhas dúvidas!!! Tenho 36 anos e dois filhos, pretendo ir no próximo ano para London em Ontário… as vezes me pego pensando se devo mesmo ir e ver sua determinação está me ajudando muito!!! Obrigada por compartilhar! Boa sorte para nós!! Bjs
Oi, Danielle. Obrigada pela mensagem.
Vou te dizer que não é fácil, mas traça um plano e segue em frente! A gente tem que correr atrás de ser feliz, né?
Beijos!
Oi Flávia. Estou a poucos meses de completar 44 anos e tenho uma filha de 3 anos. Tenho planos de me mudar do Brasil devido ao trabalho do meu companheiro (destino indefinido) e pretendo voltar a estudar. Mas confesso que me sinto bastante insegura, pois estou há alguns anos sem estudar e, principalmente, por meu inglês estar em desuso, o que creio ser prejudicial. Mas seu texto foi bem inspirador. Espero recuperar o ânimo para traçar meu projeto. Abraços.
Mary, desculpe, mas só apareceu sua mensagem agora pra mim!!! Espero que vcs tenham tomado uma decisão bacana pra sua família.
Tem como fazer faculdade e trabalhar ao mesmo tempo?
Raphael, quando vc tem o visto de estudo aprovado para fazer college, você tem direto a trabalhar até 20 horas semanais, ams não pode ultrapassar isso. Só tenha em mente que os colleges às vezes são puxados, com muito dever de casa e trabalhos em grupo e que os empregos que vc conseguirá nesse ponto, serão ganhando salário mínimo. Seria uma espécie de ajuda nas despesas.Abs, Flávia