Pensei muito sobre o tema que escreveria para o Brasileiras pelo Mundo. O mes passado, Fevereiro, foi o mês de São Valentim (ou Saint Valentine) e aqui nas Filipinas, esse dia é muito comemorado, com todos os lugares enfeitados com enormes corações vermelhos e rosas. Também esse é o mês após minhas longas (e merecidas) férias no Brasil, onde passei 4 lindas semanas me divertindo como uma turista.
Sei que esse blog se chama Brasileiras pelo Mundo e não Brasileiras Expatriadas de Volta ao Brasil, mas achei tão interessante ver o Brasil através dos olhos de uma turista que decidi compartilhar essa experiência.
Se vocês seguem o que eu escrevo, já sabem que sou de São Paulo. Saí da cidade há quase seis anos e tento voltar ao Brasil pelo menos uma vez a cada um ano e meio. Para mim esse é o tempo que eu consigo ficar longe da minha família, da comida da minha mãe e dos meus amigos sem enlouquecer, querer largar tudo e voltar para o meu país. Porque, embora eu tenha escolhido o mundo como o meu lar, sempre serei brasileira e parte das minhas raízes estarão presas em algum lugar da Avenida Paulista.
O engraçado é que todas as vezes que vou ao Brasil, embora eu seja brasileira, me sinto cada vez mais como uma estrangeira no meu próprio país. Isso não tem nada a ver com os meus amigos, quem eu amo e continuo tendo conversas interessantes, mas tem a ver com a cidade e com o sentimento que, talvez, eu não pertença mais àquele lugar, embora sinta um carinho imenso por ele, como se o visitasse em sonhos de vez em quando ou como se ele fosse um velho amigo que não vejo há muito tempo e, de repente, o encontro um dia: embora já não exista mais nada em comum entre nós, vivemos tantas coisas boas juntos que o sentimento e o carinho permanecem.
Esse sentimento é um pouco complexo e talvez não o esteja explicando muito bem. Talvez alguém que tenha vivido isso entenda o que eu tento explicar nessas linhas que carregam sentimentos saudosistas.
Também percebi que quando eu saí do Brasil, ao conviver com pessoas de tantas origens diferentes, minha cabeça foi forçada a se abrir e me tornei uma pessoa um pouco menos crítica em relação ao mundo que me rodeia. Hoje, por exemplo, não me importo se estou na fila do supermercado e à minha frente está uma mulher com pijamas. Embora não acredite que vá algum dia ao mercado vestindo pijamas (peço encarecidamente que me internem se um dia o fizer), se as pessoas se sentem bem saindo às ruas com as mesmas roupas que elas dormem, que elas sejam felizes da mesma forma como eu sou feliz com meus 200 pares de sapatos.
Quando estava no Brasil, conversávamos eu e uma amiga que morou em Dublin (e quer sair do Brasil outra vez). Estávamos falando sobre as Havaianas e como ninguém em São Paulo as utilizava nas ruas. Ela me contou que, um dia, ia ao shopping center com suas Havaianas no pé e, quando seu pai a viu, lhe perguntou: “você não tem sapatos?”. Rimos muito dessa frase porque Havaianas, no exterior, é considerada uma marca. Eu mesma trouxe cinco ou seis pares para mim, outras mais para dar de presentes a amigos e as uso até para sair para jantar.
Em Boracay, uma das praias mais famosas do mundo (em 2011 foi considerada a segunda praia mais bonita do mundo pelo Trip Advisor), as Havaianas investem muito em propaganda, com outdoors, eventos durante o verão e até velas dos barcos que ficam na praia. Em Barcelona, a marca possui uma loja próxima a Praça Catalunya. Havaianas é uma marca que merece sim respeito (e qualquer estudante de marketing que tenha lido o case da empresa sabe disso).
O que eu pensei depois foi como éramos provincianos. Em São Paulo, sempre comentamos como as pessoas se vestem ou se comportam e estamos sempre preocupados com que outras pessoas pensarão de nós. Nos vestimos e comportamos como o nosso grupo, pendentes sempre da opinião alheia.
Me lembro que uma amiga que foi me visitar em Dublin, saiu com um rapaz. Enquanto conversavam, ele disse a ela que tinha uma namorada e a sua resposta foi “por favor, não pense que eu sou uma vagabunda porque estou saindo com você…”. Honestamente, quem se importa com o que esse cara vai pensar ou não? É muito provável que jamais voltem a se encontrar!
Como deixei de me importar qual a opinião que a maior parte das pessoas tem em relação a mim há alguns anos, não havia percebido como essa nossa dependência cria amarras e nos tornam reféns de nós mesmos. De uma forma um pouco louca, ficamos presos a um mesmo comportamento sempre com medo de mudar e não sermos aceitos em nossos grupos sociais.
Outro amigo me disse que o brasileiro é um povo classista e, embora eu não goste de generalizar (afinal, o Brasil é um país imenso e um comportamento comum em uma região do país pode não ser comum em outra), tenho a tendência de concordar com o que ele disse. Em São Paulo, pelo menos, eu não tinha amigos de diferentes classes sociais: meu grupo de amigos e conhecidos se restringia a pessoas que tinham o hábito de frequentar os mesmos lugares, que estudaram em colégio privado e, em sua maioria, frequentaram a univerdade e embora pudesse conhecer e até conversar com pessoas de distintas classes sociais, essas pessoas nunca se tornavam meus amigos. Talvez por isso julgamos tanto, olhamos o desconhecido com olhares desconfiados e com medo que as nossas próprias ações serão julgadas pelo outro.
Ao viver no exterior, ao perder minhas referências, descobri que as pessoas não tem passado e fiz amigos de todas as classes. Percebi que para desenvolver uma amizade, não precisávamos pertencer a uma mesma nacionalidade ou compartilhar um mesmo passado, mas precisávamos ter sim coisas em comum sobre as quais pudéssemos conversar. Hoje, não sou amiga de todos os brasileiros que cruzam o meu caminho porque, talvez, não tenhamos nada em comum além do fato de termos nascido dentro das mesmas fronteiras, mas sou amiga sim daqueles que dividem comigo a mesma alegria de viver, daquelas pessoas cujas conversas podem durar horas ou com as quais possa dividir momentos de silêncio sem me sentir incomodada. São essas pessoas, independente da nacionalidade, classe social ou crença, que hoje, divido o meu dia-a-dia e tenho orgulho de chamar de amigos.
Sempre com as minhas Havaianas no pé! 😉
9 Comments
Tati,
Como e verdadeiro o que voce falou…e como me reconheco tambem. Depois de 23 anos morando fora, o que deixei so existe ainda na minha mente e lembrancas. Tudo e diferente, a cidade, as cores, as pessoas. Quando vou de ferias (e nunca vou rs), me da um choque imenso, acredito que inconscientemente espero ouvir os mesmos sons e ver as mesmas situacoes, mas, infelizmente, elas se foram, hoje em dia so fazem parte do meu passado e da minha historia. Da uma dorzinha quando percebo que tudo mudou, mas, ao mesmo tempo, fico feliz quando venho embora, porque ja nao me sinto mais em casa, e como vc mesmo falou, existe um carinho imenso, algo que ja passou….E as atitudes, ai meu pai rs, sou criticada por tudo, porque nao passo roupa (sorry, 20 anos de Londres rsrs, costumes que se aprendem bem rapido kkk), parece que e tudo premeditado, se voce nao fizer o esperado, ninguem sabe como reagir, e um susto para eles. Talvez o ponto mais positivo e a licao mais valiosa que se aprende morando fora e nao ligar mais para o que os outros pensam, como vc tambem disse, supermercado de pijama, eu tambem nao iria, mas aqui e normal, chinelo no restaurante no verao (que delicia!) e com isso seguimos a nossa vida aqui fora, com o coracao cheio de memorias do passado e de havaianas no pe sempre 🙂 xx
Essas lembranças são complicadas, né Ann? Tenho muitas amigas que estão voltando para o Brasil e sempre me dizem como é difícil a re-adaptação. Acho que quando chegamos a um país estrangeiro, somos forçadas a nos adaptar porque senão morremos. Quando voltamos, o choque é enorme porque parece que tudo continuou, everyone and everything moved one, menos nós que ficamos parados no tempo…
Sobre passar roupa, nem a minha mãe passa calça jeans! HAHA! Quando fui morar na Irlanda, tive aulas básicas 101 de como ser dona de casa com minha tia que morava na Alemanha. Ela me ensinou a passar. Eu esqueci. Decidi que não valia a pena comprar nada que exigisse ferro de passar! HAHA!
E sim!!! Havaianas no pé (a Havaianas deveria ter pago o patrocínio desse post, Ann! Vamos cobrar! HAHA!)
PS: linda, porfa, troca o endereço do meu blog??? Agora eu mudei para o wordpress! 😉 O endereço é http://tatisatotrotamundos.wordpress.com/
BEIJOS!
Oi Tati,
compreendo muito bem do que vc fala kkkkk eu também sou uma Havaiana adepta e assumida, e nao so isto, depois de tantos anos fora do Brasil, e sempre tendo que me vestir bem em situaçoes de trabalho, me permito hoje no meu tempo livre ficar sem maquiagem, com meu cabelo natural, sem muita produçao, com roupas comfortaveis e isto também quase mata a minha mae de vergonha e raiva quando estou no Brasil, kkkkkkkk pois pra ela, como eu executiva rsrrssr (empresaria aprendi que é = desempregada, enrolada rsrsrrs) posso ficar andando deste jeito na rua? kkkkkk o que os outros vao pensar? kkkkk meus amigos por outro lado adoram minha naturalidade, veem como se eu continuo a mesma pessoa autentica que sempre fui. Eu rio sempre e muito, nos meus encontros de negocios no Brasil, porque como as pessoas imaginam que atraves dos meus “titulos” e do fato de eu morar na Suiça, esperam que vai chegar alguem cheia de roupas de marca e fazem de tudo pra me impressionar, e pra surpresa deles, chego eu rsrsrrsr e quero ir almoçar em comida a quilo, onde posso matar saudades das comidas que me fazem falta, pensam sempre em me levar a restaurantes franceses, japoneses, internacionais srrsrsr e eu tenho que lembrar que moro na Suiça francesa e nao preciso ir ao Brasil pra comer comida francesa, né?! rsrrsrs é muito engraçado a falta de segurança na nossa cultura, nossa cultura é tao cheia de paradoxos que eu nao sei se choro ou rio, mas ai de novo como Brasileira desencano e rio. Fico triste de ver que na nossa cultura ainda tem tanto preconceito. Eu venho de Belo Horizonte, e as pessoas sao mais simples, na Bahia, e no Sul do pais também acho as pessoas mais simples, mas Sao Paulo é extremo, no Rio de Janeiro acho é o estilo mais descontraido mas também no mesmo esquema, as pessoas se mapeam atraves de codigos vestimentais e marcas internacionais (Havaianas como produto nacional e historico de produto popular nao conta rssrsrsr). Gostei muito do seu texto. Ah queria ainda fazer um comentario, Eu ensino “Cross Cultural Business Issues” e por incrivel que pareça quando falamos do Brasil, uma das regras é que “devem se vestir bem, para serem respeitados”! Como vc vê ja virou fato academico! rsrsrsr Em caso de primeiro contato de negocios, no Brasil é onde eu levo mais roupas e as roupas mais “Chic” rsrrsr mas so na primeira vez, pq depois as pessoas se acostumam a mim, e aih é sem problemas, afinal agora sou “Suiça” quando me apresentam! rsrrsrssreu Choro de rir! e sempre corrijo que sou mineira e minha mae vem de Taiobeiras por favor! rsrrssrrs Outra coisa é como as pessoas tratam os empregados, os recepcionistas, motoristas de taxis, camareiras, garçons….. eu adoro esbanjar gentileza e ser super grata, bater papo com eles, quem sabe um dia as pessoas se tocam e conseguem superar estas barreiras sociais! Esperemos!!!!! rsrrsrs Afinal nao tenho problema se alguem veste pijama no supermercado, mas tenho problema com discriminaçao social!
Oi Ana! Adoro os seus comentários, sempre! Eu era muito ligada a códigos de vestimentas quando estava no Brasil. Uma passagem de três anos e meio pela Europa me ensinou que tenho que me vestir da maneira que me faz sentir bem. Amo todos os meus pares de Havaianas que não tiro do pé, nos fins de semana, a não ser que eu vá para uma balada… =)
Nós, brasileiros, infelizmente somos muito classistas… Acho que isso é problema de países em desenvolvimento, nos quais a diferença sócio-econômica é muito grande. Digo isso porque aqui, nas Filipinas, é igual: ninguém cumprimenta os porteiros ou os rapazes da segurança (só estrangeiros fazem isso! HEHE!). Eu, por exemplo, sempre falo oi. Um segurança que trabalhava no prédio onde morei está trabalhando no shopping e eu fiquei super feliz por ele! Eu sempre o cumprimento, quando o vejo… Infelizmente, como as pessoas são um pouco intrometidas por aqui também, quando começam a perguntar muito da minha vida, eu corto… Bem, acontece!
Você deveria vir para Manila para fazer um aperfeiçoamento da sua aula de “Cross Cultural Business Issues”. Alguma coisa disso estará no meu próximo texto! Beijos!
Tati, eh tao facil me identificar com o q vc escreveu…..especialmente apps 20 anos vivendo no exterior…..
Londres em particular reflete aquele motto freedom of expression porque nao importa de onde vc eh, o q importa eh como vc se sente bem; e acho q com excecao de sair pelado, em Londres a gente ‘ve de tudo…..eu amo Londres e essa liberdade de expressao. Ja estou acompanhado o trotamundo. Bj
Oi Ana! Fico super feliz que você gostou do texto!!! O Trotamundos mudou de endereço (acho que o blog reflete um pouco da minha personalidade inquieta – literalmente! HEHE!): http://tatisatotrotamundos.wordpress.com/
Morar na Europa é uma benção por causa do freedom of expression que adquirimos. Amo a Europa e sempre vou considerá-la meu lar, embora eu seja brasileira de coração… Acho que você me entende quando digo isso!
Bom, é isso!!! Um grande beijo e até logo!
Pingback: Comemorando o Primeiro Aniversario. Parabens Brasileiras Pelo Mundo!
Tati boa noite! Eu sei que não é o link certo.. Mas não achei nenhum para perguntar a respeito, com relação as numerações de sapatos masculinos nas filipinas são o mesmo que dos EUA, por exemplo size 11, venha ser qual numeração aqui no Brasil? Se puder me responder, ficaria agradecida. Obrigada e parabéns pelo site.
Oi Daniela, tudo bom?
A numeração de sapatos nas Filipinas é a mesma que a americana. Eu sou um size 8 lá e, no Brasil, é size 36. Olha esse site: http://www.convertworld.com/en/shoe-size/Brazil.html
Beijos e tudo de bom!