Desde 2015 temos visto aumentar bastante o número de brasileiros que desejam deixar o país. Às vezes, no desespero, prós e contras não são considerados, levando ao arrependimento. Como já foi dito por diversas autoras aqui do BPM, essa não é uma decisão fácil, pois ela precisa ser analisada cautelosamente para evitar certas dores de cabeça e minimizar inevitáveis contratempos. Nos últimos textos, falei sobre dez vantagens em morar na capital Varsóvia e o que levaria da Polônia para o Brasil. Agora vamos falar sobre algumas dificuldades.
Conviver com a distância
Eu diria que este é uma das principais dificuldades, sobretudo nos primeiros meses. De fato, o Brasil está muito distante; ficou metade da Europa e um oceano inteiro para trás. Embora vivamos na era da tecnologia, ainda não há voos diretos entre os dois países, o que torna uma possível ida de emergência ao Brasil mais difícil. Outro ponto sobre estar distante da família é que você não terá seus pais, avós ou outros parentes próximos para socorrê-lo em caso de emergências, como quando não tiver com quem deixar o filho quando começar a trabalhar, por exemplo. Sentimentos como frustração, impotência, cansaço e a vontade de voltar para o Brasil passarão por sua cabeça, cedo ou tarde. Se estar longe da sua família é algo difícil, talvez você ainda não esteja preparado para morar fora.
Aprender a língua
Embora eu já tenha escrito um pouco sobre minha experiência com o aprendizado de línguas, não há como negar que o polonês é uma língua extremamente difícil e que, dependendo das circunstâncias, você pode sentir-se desmotivado e desistir para sempre. Conheço várias pessoas que estão aqui há mais de 5 anos e que simplesmente desistiram da língua. Em Varsóvia e outras cidades maiores, grande parte da vida prática pode ser feita em inglês, mas certas tarefas do dia-dia como ir ao médico, a algum órgão público, fazer compras ou pedir um táxi entre tantas outras atividades corriqueiras, pode se tornar um verdadeiro suplício e gerar uma frustração muito grande, sobretudo ao se fazer comparações à vida independente em nossa terra natal.
Inserção cultural
Os poloneses, em sua maioria, são solícitos com os turistas. Mas muito dificilmente você fará amigos poloneses, nos primeiros meses de estadia, salvo algumas exceções. O primeiro contato para uma amizade pode surgir após um shot de vodca (situação onde se soltam totalmente), um convite para um casamento, para um jantar ou reunião íntima, como um aniversário, Imieniny (dia do nome) ou uma Parapetówka (reunião com amigos ao mudar-se para uma casa nova), caso você tenha algum amigo ou familiar em comum. Nos primeiros meses ou mesmo anos, suas amizades serão com estrangeiros e outros brasileiros – o que, do meu ponto de vista, é interessante pela experiência intercultural, para amenizar a saudade de casa e manter os traços culturais em comum, mas isso pode levá-lo a um isolamento, vivendo apenas em comunidades estrangeiras. De qualquer forma, o intercâmbio com outras culturas é importante para começar a entender a cultura polonesa. Uma amiga minha me disse algo interessante: enquanto na cultura brasileira podemos fazer amizades facilmente após um primeiro contato, sem nunca ter visto a pessoa anteriormente, adentrar à cultura polonesa é algo desafiador, como transpassar um muro alto inicialmente, mas após isso, eles serão seus amigos para sempre.
Prática de outras religiões
O católico praticante vai se sentir em casa. Mesmo que haja a barreira da língua, você encontrará missas em línguas como inglês ou espanhol. Na capital Varsóvia, quem for praticante de outras religiões não terá dificuldade para encontrar sinagogas, igrejas ortodoxas ou protestantes, templos budistas e até mesmo mesquitas. Já em outras cidades, essa diversidade é quase inexistente (com algumas exceções). Por ser um país de maioria católica, quase tudo na sociedade remete ao catolicismo, da devoção ao Papa João Paulo II aos mais diversos símbolos católicos espalhados pelo país. E mesmo não o sendo, você acabará envolvido com os hábitos e práticas culturais oriundas da religião, como nas celebrações mais importantes: a Páscoa, o Natal, o Corpus Christi e o Dia de Finados. Isso pode inibir a profissão de sua fé não-católica publicamente, mas não impedi-la. Contudo, vale lembrar que, infelizmente, o país vem passando – como toda Europa – por uma onda de hostilidade a muçulmanos e, consequentemente, àqueles que possuam um fenótipo árabe (não simplesmente ser de origem árabe, mas simplesmente parecer-se com um árabe, especialmente os homens).
Veja também: Imigração e preconceito na Polônia
Um clima de extremos
A Polônia é um país que carrega a fama de invernos intensos, mas os verões também são bem quentes. Além disso, Varsóvia é uma cidade cuja umidade do ar é muito baixa, o que acaba atingindo nosso corpo inevitavelmente, sobretudo pele, mucosas e olhos. Enfrentar altas temperaturas é algo suportável, pois – apesar da diversidade climática – viemos de um país tropical. Entretanto, se você não estiver acostumado a temperaturas muito baixas, poderá sofrer, sobretudo no primeiro inverno, sem saber como se proteger adequadamente. Além disso, adaptar-se à nova rotina pode gerar certo incômodo para alguns no inverno, tais como enfrentar oscilações de temperatura de ambientes congelantes para ambientes internos devidamente aquecidos toda vez que sair de casa, ou tiver que limpar a neve à frente de sua casa (passível de multa caso não seja feito). Quem tem filhos precisa ter um cuidado redobrado para evitar certas doenças, não apenas no inverno, mas nos períodos de transição das estações (sobretudo do inverno para a primavera), onde é quase inevitável não ter alguma doença respiratória, fora eventuais dores de cabeça devido à mudança climática e à pressão atmosférica.
Novas rotinas e hábitos
A Polônia é um país que, como o Brasil, carrega hábitos bem peculiares que podem entrar em contraste logo quando se percebe não ser mais um turista. O que pode parecer grosseiro para nós (como assoar o nariz ruidosamente em público, por exemplo) ou invasivo para eles (como cumprimentar uma pessoa com abraços e beijinhos) pode gerar certo desconforto para ambas partes. A comida também é bem diferente, e pode causar algum estranhamento no começo, até que se aprenda a fazer adaptações, usar ingredientes e temperos equivalentes ou simplesmente se acostumar com a comida local.
Aqui não há Carnaval (embora haja festas temáticas), as praias são bem frias e manifestações públicas (festas, afetos, etc.) são mais contidas. Aqui não se pede para segurar a bolsa de um estranho no transporte público, tampouco beija-se efusivamente em público. Não há lojas ou serviços 24 h (com exceção dos correios e algumas lojas que vendem bebidas alcoólicas) e quando há um feriado, quase tudo fecha.
No primeiro ano você ainda não terá se acostumado com os feriados e as datas festivas diferentes do nosso calendário. Aqui também é incomum ter alguém para fazer serviços domésticos (que é visto como um luxo) ou comprar em demasia em uma única ida ao supermercado, nossa famosa “compra do mês” (não é comum o hábito de estocar alimentos, vide a cultura do não-desperdício, que observei sobre o povo polonês). Todos esses pequenos detalhes do dia-dia você vai aprendendo e se adaptando, cedo ou tarde. Ou não, caso não esteja aberto às novas mudanças.
Pense bem sobre tudo isso antes de tomar uma decisão e até a próxima!
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Leia também: 5 coisas que eu levaria da Polônia para o Brasil
17 Comments
Nossa, muito bom! Eu e meu noivo estamos pensando em ir para a Polônia. Seus textos são muito importantes para nós. Temos ciência das dificuldades que nos espera. Procuramos nos preparar com um planejamento à logo prazo. As informações que você posta são importantes para nossa preparação e saber os contras é muito mais importante que os prós. Obrigada e por favor, continue escrevendo sempre!
Olá, Rose Marie!
Muito obrigada pelo seu comentário. Fico muito feliz quando posso contribuir de alguma forma com vocês, pois um dia eu passei pelo mesmo.
Continue nos acompanhando que todo mês tem um tema novo.
Boa sorte e mais uma vez, obrigada!
Abs,
Vivian
Ola Vivian, tudo bem. Eu tbm estou morando na Polonia, e devo concordar que passo por alguns perrengues diariamente. Eu estou trabalhando aqui e a principio ficarei mai um tempo …. Moro em Szczecin, mas estava pensando em me mudar para alguma cidade maior, pq que me sinto um pouco isolado aqui, ate agora conheci apenas um brasileiro que foi embora =/. Vi que vc esta em Varsovia, e das oportunidades para brasileiros?
Olá, Luan
Sim, há oportunidades sim, a maioria das vagas são para Varsóvia, Cracóvia, Wrocław, Łódż e Katowice. Mais fácil na área de TI e Help Desk.
Eu gosto muito de Varsóvia, acho que você iria gostar também.
Obrigada pelo seu comentário. Continue nos acompanhando.
Abs,
Vivian
Olá! Então eu que moro em em Curitiba PR, estou me vendo na Polônia… rs
Faz frio demais no inverno, calor demais no verão, baixa umidade do ar é normal…
Pessoas não demonstrarem afeto em público (beijar, abraçar, rir alto)… Posso ir para Polônia então, me sentirei em casa!
Olá, Anderson
Já ouvi curitibanos comentarem isso. Posso arriscar que alguns paulistanos também. 🙂
Obrigada pelo seu comentário e continue nos acompanhando.
Abs,
Vivian
Parabéns! Fui morar em Varsóvia no inverno de 2010 e passei por tudo o que disse.
Com relação a amizades, minha família é de descendência polonesa e não sofri muito.
Mas o pior é que eles não são educados e não tomam banho com frequência, hehehe
Olá, Ana
Sim, as pequenas coisas do dia-dia vão amenizando com o tempo, mas a gente acaba se acostumando.
Não sei se você já conhece, mas há um grupo no Facebook chamado ‘Brasileiras na Polônia’.
Obrigada pelo seu comentário.
Abs,
Vivian
Muito interessante conhecer outros países, especialmente o dos nossos bisavós.
Olá, Acir
A Polônia é um país que me encanta cada dia mais, mas para fazer uma mudança desse porte, é necessário considerar muita coisa antes de vir.
Obrigada pelo seu comentário. Continue nos acompanhando.
Abs,
Vivian
Parabéns pelo texto! Incrível como seus textos me prendem… quando acaba continuo procurando mais!
É a segunda vez que venho morar por aqui. A primeira foi em 98, fiquei por um período de 3 anos, mas tinha o privilégio de voltar ao Brasil a cada 3 meses. Sempre desejei voltar e assim aconteceu. Hoje estou morando na Eslováquia com malas prontas para Bielsko. Confesso que sempre me diverti com a presenças de Polacos em meus eventos, são divertidos e adoram dançar, cantar e beber, rssss. Quanto ao idioma estou ainda na luta, mas coincidentemente vários deles falam italiano, como me casei com um, não tenho dificuldades em me comunicar, e depois tem a língua dos mudos… rsss essa aí é infalível! Mas agora que abri meu próprio negócio tenho que aprender a todo custo o idioma. E quanto ao clima, eu adoro, aqui vivemos as 4 estações na íntegra! É maravilhoso!
Olá, Tania
Muito obrigada pelo seu comentário, fico muito feliz quando vocês dão esse retorno. E que bom saber que estou ajudadndo de alguma forma.
Quanto ao idioma é um caso à parte, mas é muito importante para a integração à sociedade e à nova cultura.
Continue nos acompanhando e seja bem-vinda, a Polska te espera.
Abs,
Vivian
Super importantes seus pontos a considerar. Se me permite tenho 1 consideração que do meu ponto de vista é importante: mais duro que o tempo inverno, é a falta de luz solar e seus dias curtos. Infelizmente minha experiência com os polacos me traz a impressão de que em sua maioria são poucos solícitos a turistas e estrangeiros. São bem pouco flexíveis e nada amáveis com culturas diferentes. Obviamente há exceções. Gostaria que as experiências ruins fossem a exceção.
Olá Silvia,
Sim, realmente, este é um ponto muito importante: a falta de luz solar é algo que nos afeta bastante, mesmo que aqui seja por um período menor – comparado aos países mais próximos ao Círculo Polar Ártico – nosso organismo muda e isso é sentido de várias formas, como cansaço, sonolência, mau humor, cabelos e unhas fracas… Com relação ao temperamento dos poloneses, de um forma geral, é isso mesmo. Demora muito para poder fazer parte de seu círculo de amizades, às vezes, pode demorar anos, se não houver um certo empenho de nossa parte.
Obrigada pelo seu comentário.
Abs,
Vivian
Um dos motivos de serem assim é a herança comunista deixada pelos soviéticos de quando a Polonia estava sobre seu domínio. Não podia andar com mais de uma pessoa na rua, não podia rir demais, tinha que andar olhando pra baixo, havia a preocupação que os outros fossem espiões que te dedurariam pro “governo” e voce sumisse (como acontecia) e por aí vai. Ja vi alguns poloneses e alguns brasileiros que moram na Polônia falando sobre isso.
Olá Vivian tudo bem… me chamo Selonir morro em Jundiai SP estamos pensando em ir morar na polônia, mas preciso e poznan . Temos muitas duvidas posso te mandar elas quem sabe eu fique menos ansiosa..
Obrigado..
Seus comentários são otimos.
Olá Selonir,
Obrigada pelo seu comentário. Temos, no Facebook, um grupo para brasileiras que vivem na Polônia e brasileiras que pensam em vir para a Polônia – seja a turismo ou para emigrar – e buscam mais informações sobre o país. Você será muito bem-vinda.
https://www.facebook.com/groups/1650629498508851/
Além do grupo, continue nos acompanhando aqui no blogue.
Abs,
Vivian