Este texto traz reflexões sobre o pós-pandemia. Será que já podemos chamar de pós-pandemia?
Já sei o que você está pensando: “lá vem outro texto sobre a coronavírus”. Entendo essa “fadiga”. Parece que o tema já foi explorado de todas as formas, por isso tentarei fugir do óbvio.
Não vou falar do estresse de fechar meu office correndo, de chegar para trabalhar junto com o caminhão da funerária (vários dias seguidos). Nem vou lamentar a perda de colegas de trabalho nos EUA, ex-colegas no Brasil, parentes e vizinhos.
Vou deixar esse relato devastador de lado, apesar de saber que muita gente ainda chama a tsunami COVID de marola.
Também não vou dizer que a pandemia é um tempo de mudança, que estamos passando por isso juntos e nem que estamos tendo tempo para valorizar o que realmente importa e priorizar a família.
Posso falar a verdade? Não é bem assim. Sinto que durante a pandemia, todos os pequenos problemas que nos aborrecem foram colados sob uma lupa e que fomos colocados à prova num Big Brother misturado com Pegadinha do Malandro.
Reflexões sobre o pós-pandemia: Opções e decisões
Logo no começo, quando praticamente todo mundo reclamava de estar trancado em casa, sem ver os familiares e amigos, eu pensei “agora vocês entenderão o dia a dia de quem mora em outro país”.
Achei que seria um marco da empatia, mas me enganei porque morar fora é escolha e o distanciamento por COVID não foi uma opção.
Por exemplo, moro em NY porque quero, estar longe é uma consequência ou um preço que pago por escolha própria.
É difícil estar longe, mas ao mesmo tempo, estou realizando o sonho da minha vida. Então, não – o distanciamento da pandemia não é comparável à vida de expatriada, pois a pandemia nos forçou a mudar a rotina. Não foi uma escolha.
Questionamentos durante a COVID-19
Meu maior questionamento durante esse período foi se estar tão longe vale a pena. A gente se sente super seguro para dizer “é preciso sair de casa”, desbravar o mundo, ir embora. Mas como sabemos quando é a hora de voltar?
Não sei responder essa pergunta, só sei dizer que ficou mais difícil ser expatriada durante a pandemia. Primeiro, por vários problemas burocráticos. Pessoas que dependem de visto, seja para trabalho ou estudo, passaram por momentos de insegurança.
Alguns perderam oportunidades de trabalho com vistos que não foram renovados e tiveram que retornar ao Brasil. Estudantes também ficaram na dúvida sobre visto, já que as aulas presenciais foram canceladas.
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Segundo, precisamos reaprender a lidar com incertezas: será que a família no Brasil está bem? Quando poderemos nos ver de novo?
Será que vale a pena estar tão longe? Será que é hora de voltar pro Brasil? Essas dúvidas sempre existiram, mas ficaram mais dolorosas graças à COVID-19. Acho que muitos expatriados pensaram a mesma coisa.
Percebo isso conversando com amigas brasileiras que moram aqui em NY, pois tanto a cidade (New York City), quanto o estado de NY sofreram um impacto intenso com esse vírus. Foram muitas perdas, desemprego, problemas de saúde.
Flexibilidade na incerteza
Dentre tantos problemas causados pelo vírus, a incerteza quanto ao futuro afetou a todos, em maior ou menor grau. Como diz Chico Buarque “a gente quer ter voz ativa, no nosso destino mandar”, mas eis que chego o corona e carrega o destino pra lá.
Quem mora longe da família se apega aos planos e passaportes como meta e refúgio para a vida e saúde mental. O semestre está puxado na faculdade? A gente sonha com a viagem ao Brasil no final do ano para recarregar a bateria.
A saudade está muito grande? Bora visitar a família, nem que seja por uma semaninha. O inverno está de lascar? Vamos fugir para o Brasil e renovar o bronzeado.
A gente acha que tem tudo sobre controle e que vai dar tudo certo já que temos planos e passagens compradas. A pandemia nos tirou isso e tornou a distância e a saudade ainda maiores.
Recomeçar é Preciso
Por mais que a gente queira acreditar que tem tudo sobre controle, a verdade é que a vida é um sopro e nós sabemos muito pouco sobre o que está por vir.
Ter planos e metas é super importante. Planejar o futuro é tão essencial quanto cuidar da saúde. Acima de tudo, é preciso ter flexibilidade para lidar com os imprevistos, seja uma ameaça invisível, seja algo que podemos nos preparar com antecedência.
Ao longo destes quase 8 anos fora, estabeleci uma rotina de fazer chamada por vídeo diariamente com minha mãe e manter contato constante com os amigos e família e visitar no final do ano.
Como diria Guimarães Rosa “o correr da vida embrulha tudo” e nem sempre consegui fazer essa visita anual.
Antes, eu queria visitar o Brasil nas datas especiais: Natal, aniversários… com a pandemia aprendi que especial mesmo é estar junto.
Não precisa ser feriado, nem data comemorativa. Pode ser numa segunda-feira chuvosa quando nada mais tem graça. Pode ser nos piores dias da TPM.
Eu finalmente aprendi que não existe ocasião melhor do que a presença sem motivos e espero poder usufruir dessa dádiva em breve!
E para terminar
Quando escrevi este texto, estávamos seguros. Casos sob controle, uma vida quase “normal”. Agora, no final de novembro, estamos novamente sob o risco de um novo lockdown devido ao aumento nos números de casos.
No começo desse texto eu disse que não falaria das coisas ruins da pandemia, mas espero que você entenda que o pesadelo não acabou ainda. Minha experiência foi avassaladora, com colegas, vizinhos, amigos da família antes saudáveis, morrendo de uma hora para outra.
O impacto foi terrível e por mais que ficar longe e usar máscara seja ruim, esas são as únicas formas de garantir a saúde de todos. Se cuidem!